sexta-feira, outubro 27, 2017

IMAGINÁRiO #393

José de Matos-Cruz | 01 Novembro 2012 | Edição Kafre | Ano IX – Semanal – Fundado em 2004

PRONTUÁRiO

FIGURAÇÕES
Memória e viagem mesclam-se, num registo artístico e intimista, após Everest, e através de Israel SketchBook e NewBorn - 10 Dias No Kosovo por Ricardo Cabral - pintor de formação, inspirado pela fotografia - um dos nossos mais aliciantes criadores actuais de banda desenhada, também autor da capa de dois cadernos Moleskine sobre Barcelona.
Outra vez sob chancela Asa, Ricardo Cabral junta Pontas Soltas sobre cinco Cidades - Angoulême, Lisboa, Portimão, Lódz e Barcelona - num envolvimento insinuante, inextrincável, de impressões e apontamentos, de figurações e transparências, em que se aliam os próprios sinais e as experiências fluidas - entre Janeiro de 2009 e Janeiro de 2011 - de uma carreira peculiar, partilhada entre o ser português e uma emergência internacional. Construindo a sua narrativa versátil, testemunhadora, segundo um percurso imaginário, intemporal, expressivo e caloroso, Ricardo Cabral torna-nos - afinal - leitores acompanhantes, para desvendar como «a vida é mesmo assim, feita de pequenos encontros, nós é que escolhemos a importância que eles têm para nós». IMAG.185-340-378

CALENDÁRiO

1935-24JAN2012 - Theo Angelopoulos: Cineasta grego - «Temos o hábito de separar passado, presente e futuro. Cada vez mais, nos meus filmes, desenvolvo a ideia de que não existe separação entre eles. O tempo, somos nós». IMAG.287

03FEV-13MAI2012 - No Centro Cultural de Cascais, Fundação D. Luís I expõe Colecção Ernst Lieblich (1914-2009); inclui obras de Albuquerque Mendes, Ângelo de Sousa, Augusto Gomes, Carlos Mesquita, Eduardo Luís, Francisco Laranjo, Gerardo Burmester, Guilherme Camarinha, José de Guimarães, José Rodrigues, Júlio Capela, Júlio Resende, Luís DaRocha, Mário Silva, Maria Keil, Nadir Afonso, Nikias Skapinakis, Pedro Calapez, Pedro Proença, Querubim Lapa e Sérgio Lorré.

26JAN-24ABR2012 - Em Lisboa, BES Arte & Finança expõe Políptico, com fotografias de Carmela García, Cristina Lucas, José Luís Neto, José Maçãs de Carvalho, Pedro Cabral Santo e Pierre Gonnord.

VISTORiA

Saudação

Oh geração dos afectados consumados
e consumadamente deslocados,
Tenho visto pescadores em piqueniques ao sol,
Tenho-os visto, com suas famílias mal-amanhadas,
Tenho visto seus sorrisos transbordantes de dentes
e escutado seus risos desengraçados.
E eu sou mais feliz que vós,
E eles eram mais felizes do que eu;
E os peixes nadam no lago
e não possuem nem o que vestir.
Ezra Pound (Tradução de Mário Faustino)

Un Viejo En Venecia

En Venecia, viejo y envejecido, casi mudo,
rodeado de libros, de soledad, de gatos,
el poeta Ezra Pound,
habló, en un breve, muy breve encuentro con Grazia Livi.
Le comentó, sin autocompasión y sin desprecio,
secamente, con voz entrecortada:
«Al final pienso que no sé nada.
No tengo nada que decir, nada».
Si después de tan alto ejemplo, de tan clara sentencia,
aún sigo escribiendo, arañando palabras en el humo,
no es, que la muerte me libre,
por bastardo interés o absurda vanidad,
sino tan sólo por una simple razón,
porque no conozco otro medio, a excepción del suicidio,
- innecesario es un poema como un cadáver -
para dar testimonio de nada a nadie,
del mundo que contemplo, de esta vida,
de su horror gastado y cotidiano.
Que el viejo Pound, desde su tumba,
me perdone por unir su nombre
a estas sórdidas palabras desesperadas.
Juan Luis Panero

PARLATÓRiO

A paisagem dos meus filmes é sempre interior, não tem a ver com o realismo. A Grécia é ensolarada, e eu filmo sempre com chuva, neve, neblina. Esses elementos tornam-se para mim meios de expressão, e contam a história da mesma forma que os diálogos ou os movimentos de câmara.
Theo Angelopoulos (2011)

ANUÁRiO

2010 - Sylvain Chomet realiza em animação O Mágico / L’Illusionniste, sobre argumento inédito de Jacques Tati; uma deambulação amarga e amável pelo universo imaginário de um artista virtual.

INVENTÁRiO

JACQUES TATI

Trinta anos passados sobre a morte de Jacques Tati (1907-1982), persiste um estilo de humor crítico, amável, com a ressurreição em pequeno ecrã, ou voltando ocasional aos rituais na tela - após uma prévia divulgação ampla, por meados da década de ’70, a qual permitiu atrair as jovens gerações e consolidar o prestígio de um dos mais versáteis criadores cómicos. Génio do cinema europeu, com um olhar satírico à vivência americana, tudo se consumou na personalidade excêntrica, solitária e silenciosa do Sr. Hulot. Eu estranhava as suas meias às riscas, o lacinho e aquele chapéu ridículo, mas fascinava-me por fumar cachimbo. Francês de origem russa, nascido Jacques Taticheff em Pelq, adolescente desportista e artista de music-hall, Jacques Tati abrilhantou várias curtas metragens em 1932-1946, modalidade que escolheu para lançar-se como realizador (L’École de Facteurs, 1947). Depois, Há Festa Na Aldeia (1949), As Férias do Sr. Hulot (1953), O Meu Tio (1958), Play Time - Vida Moderna (1967), Trafic - Sim, Sr. Hulot (1971)… Fanático da montagem, perdulário durante a rodagem, a partir de uma rigorosa planificação visual, Jacques Tati despediu-se com Parade em 1974.

BREVIÁRiO

Gradiva edita O Romance do Gramático de Ernesto Rodrigues. IMAG.236

Relógio D’Água edita As Raízes Diferentes de Fernando Guimarães. IMAG.264-326

Harmonia Mundi edita em CD, Heinrich Schütz [1585-1672]: Italian Madrigals por Konrad Junghänel e Cantus Cölln.

Tinta da China edita Cartas do Meu Magrebe de Ernesto de Sousa (1921-1988). IMAG.135-198-279

Sony edita em CD, sob chancela Met Opera, Richard Wagner [1813-1883]: ‘Die Walküre’, por Birgit Nilsson, Jon Vickers, Leonie Rysanek, Thomas Stewart e Christa Ludwig, com Metropolitan Opera Orchestra, sob a direcção de Berislav Klobucar. IMAG.14-68-78-86-104-111-147-212-215-285-330-390

Gradiva edita O Ponto Azul-Claro de Carl Sagan (1934-1996); tradução de Augusto Manuel Marques e Jorge Landeck. IMAG.111

Harmonia Mondi edita em CD, sob chancela Mirare, Johannes Brahms (1833-1897) por Modigliani Quatuor, com o pianista Jean-Frédéric Neuburger e a soprano Andrea Hill. IMAG.82-171-193-199-256-286-303-324

MEMÓRiA

1885-01NOV1972 - Ezra Pound: Poeta e músico americano - «O génio é a capacidade de divisar dez coisas, onde o homem comum apenas avista uma». IMAG.76

1871-03NOV1962 - Ralph Hodgson: Poeta inglês - «As blasfémias proferidas em estado de angústia valem o mesmo que as orações». IMAG.338

1809-04NOV1862 - José Estêvão: Jornalista e político português - «…Tudo isto vem do vício do modo como entre nós se administra, vem da política miserável que a tal respeito se tem seguido. Custa crer que haja ainda quem conserve um contrato que não presta para nada, que é absurdo, que tem pretensões de uma medida financeira; mas que não é senão um foco de vexames! Não é um contrato financeiro, é um escândalo. Não é útil ao País, é sim vexatório para os povos. Somos nós os únicos na Europa que conservamos uma coisa tão inaudita, é uma instituição que cumpre acabar com ela de uma vez para sempre. Só não acaba com ela a administração que não pode, não sabe ou não tem honra para administrar os negócios públicos!...» (Discurso na Câmara dos Deputados - 08JAN1852 - excerto). IMAG.32-244-252-296

1815-05NOV1872 - Antonio Aparisi y Guijarro, Marquês de Santa Eugénia: Jurista e político espanhol - «Porque amo a liberdade, não gosto do liberalismo, pois o liberalismo não é a liberdade».

1907-05NOV1982 - Jacques Tati: Cineasta francês de origem russa, criador de Sr. Hulot - «Um militar é como uma planta que temos de cuidar com todo o esmero, de modo a que não dê os seus frutos». IMAG.225-371

1585-06NOV1672 - Heinrich Schütz: Organista e compositor alemão, de cariz sacro e mestre no contraponto e na oratória musical - «Profundamente marcado pelas lições dos maiores compositores italianos, participou activamente na divulgação do estilo italiano na Germânia anterior a Bach» (Ana Rocha).

1800-07NOV1872 - José da Costa Sequeira: Professor de Desenho de Arquitectura da Academia Real de Bellas Artes desde 1836, autor de Nocões Theoricas de Architectura Civil, «distinto criador e ornamento da arte nacional» (Diário de Notícias - 08NOV1872).

terça-feira, outubro 24, 2017

IMAGINÁRiO #392

José de Matos-Cruz | 24 Outubro 2012 | Edição Kafre | Ano IX – Semanal – Fundado em 2004


PRONTUÁRiO

TESTEMUNHOS
Uma das alternativas mais aliciantes e populares, em quadradinhos, a vertente histórica - com características de reflexão ou testemunho - conjuga a expectativa de editores e criadores, ao interesse das instituições e dos leitores de todas as idades.
Tendo-se especializado, pelos últimos anos, na revisão de circunstâncias do passado, recente ou remoto, através do perfil dos seus eventuais protagonistas, ou das ocorrências mais relevantes, José Ruy concretiza outras propostas de revitalização, em incidências culturais, políticas, e em primordiais implicações comunitárias: eis
Leonardo Coimbra e os Livros Infinitos - um lançamento da Âncora Editora - evocação assumida e personificada sobre a vida e a obra do grande filósofo e pedagogo (1883-1936), cujas ideias e «inflamados discursos fizeram história e, ainda hoje, os seus pensamentos são actuais e dão resposta a interrogações e anseios do saber» - como destaca Inácio Ribeiro, Presidente da Câmara Municipal de Felgueiras. Ilustrando, solidário, o depoimento intelectual, os desafios singulares e os ideais colectivos, como artista talentoso, versátil, em afecto também pelo homem afável, generoso, José Ruy é - sobretudo - um autor português que, através dos quadradinhos, delineou o carácter com que nos posicionamos, na realidade. Inspirando o melhor da fantasia, na qual perspectivamos uma sociedade mais justa.
IMAG.4-16-19-36-61-78-96-117-129-141-149-197-223-224-252-263-267-271-279-305

MEMÓRiA

10JAN922-1989 - João de Freitas Branco: Musicólogo e matemático português, autor de História da Música Portuguesa (1959), filho de Luís de Freitas Branco - «Foi, sem dúvida, o grande educador musical dos portugueses» (Jorge Calado).

27OUT1782-1840 - Niccolò Paganini: Compositor e violinista italiano - «Isto é que é um homem! Isto é que é um violino! Isto é que é um artista! Céus! Que sofrimentos, que miséria, que tortura nestas quatro cordas!» (Franz Liszt). IMAG.92

30OUT1932-1995 - Louis Malle: Realizador, argumentista e produtor francês, do cinema internacional - «Nos meus filmes, interesso-me por personagens que se encontram numa situação em que contende algo de superior, acabando por desviá-las do seu caminho».

31OUT1632-1675 - Johannes van der Vermeer: Pintor holandês, mestre em ambientes de interior e no tratamento da luz, viveu sempre na cidade natal, cujas Vistas de Delft era considerado «o quadro mais belo do mundo» por Marcel Proust.

31OUT1902-1987 - Carlos Drummond de Andrade: Poeta e contista brasileiro - «Eterno é tudo aquilo que dura uma fracção de segundo, mas com tamanha intensidade que se petrifica». IMAG.79-384

NOTICIÁRiO

Reforma

Os carrascos franceses que foram reformados e passados à classe inactiva, são 80.
03MAR1872 - Diário de Notícias

VISTORiA

As Sem Razões do Amor

Eu te amo porque te amo.
Não precisas ser amante,
e nem sempre sabes sê-lo.
Eu te amo porque te amo.
Amor é estado de graça
e com amor não se paga.

Amor é dado de graça,
é semeado no vento,
na cachoeira, no eclipse.
Amor foge a dicionários
e a regulamentos vários.

Eu te amo porque não amo
bastante ou demais a mim.
Porque amor não se troca,
não se conjuga nem se ama.
Porque amor é amor a nada,
feliz e forte em si mesmo.

Amor é primo da morte,
e da morte vencedor,
por mais que o matem (e matam)
a cada instante de amor.
Carlos Drummond de Andrade

ANTIQUÁRiO

28OUT1892 - No Cabinet Fantastique do Musée Grévin, em Paris, Émile Reynaud apresenta o Théâtre Optique - combinando a lanterna mágica com o praxinoscópio, por onde passava uma longa tira de papel dividida em pequenos quadrados, nos quais estavam cinegramas (imagens desenhadas com ligeiras diferenças entre si) que, movimentados a cadência de dezoito por segundo, criavam pela primeira vez sobre um ecrã a ilusão de movimento (Pantomimas Luminosas). IMAG.166

OUT1872 - Neste mês, o Porto exporta 2.478.453 litros de vinho, no valor de 721:739$500 réis.

COMENTÁRiO

Mas um outro e mais sério perigo vai levantar o uso da inteligência nas sociedades primitivas - a descoberta da Morte. O animal vive sem esse conhecimento, mergulhado no mundo pelas sensações, ocupando a consciência com a acção, obturando o clamor do passado na adaptação de agora e vivendo o futuro como presente na ocupação sucessiva dos caminhos das tendências ou instintos a satisfazer.
Só o homem pensa e conhece a Morte. Ou porque seja, com Scheler, o único animal que objectiva, dizendo eu e o Mundo; ou porque, com Heidegger, viva um tempo primordial onde o passado se acusa no presente e onde o futuro se abre à projecção da sua angústia.
Heidegger encontra, com efeito, na existência humana perdida no mundo e na existência humana reencontrando-se, os caracteres fenomenológicos da existência. A fenomenologia da existência é, para ele, a ontologia da realidade. Existência, que se encontra na existência humana, pois que nenhuma existência há que não esteja nesta envolvida - ele o conclui por um renovo do argumento ontológico de Santo Anselmo. O primeiro carácter dá a inquietação, o mal-estar e o medo, que o homem banal adormece na uniformidade do mal de todo o Mundo. O segundo carácter dá a angústia perante o desamparo da sua existência finita e humilhada. Esta angústia é, sobretudo, a angústia perante a Morte, temporalização primordial, em que o passado e o presente se englobam num verdadeiro futuro.
Leonardo Coimbra
- O Homem às Mãos Com o Destino (1936)

Satânico é meu pensamento a teu respeito, e ardente é o meu desejo de apertar-te em minha mão, numa sede de vingança incontestável pelo que me fizeste ontem. A noite era quente e calma e eu estava em minha cama, quando, sorrateiramente, te aproximaste. Encostaste o teu corpo sem roupa no meu corpo nu, sem o mínimo pudor! Percebendo minha aparente indiferença, aconchegaste-te a mim e mordeste-me sem escrúpulos. Até nos mais íntimos lugares. Eu adormeci. Hoje quando acordei, procurei-te numa ânsia ardente, mas em vão. Deixaste em meu corpo e no lençol provas irrefutáveis do que entre nós ocorreu durante a noite. Esta noite recolho-me mais cedo, para na mesma cama te esperar. Quando chegares, quero te agarrar com avidez e força. Quero te apertar com todas as forças de minhas mãos. Só descansarei quando vir sair o sangue quente do seu corpo. Só assim, livrar-me-ei de ti, mosquito Filho da Puta!
Carlos Drummond de Andrade

CALENDÁRiO

1936-17JAN2012 - Carlos Pujol: Escritor e editor espanhol, membro permanente do júri do Prémio Planeta - «Erudito, culto, afável… Era um grande homem de letras, universalmente respeitado e apreciado por todos» (José Manuel Lara).

18JAN-25FEV2012 - Em Lisboa, no Teatro da Politécnica, Artistas Unidos apresenta Dias de Vinho e Rosas de Owen McCafferty; com Maria João Falcão e Rúben Gomes.

26JAN-15ABR2012 - Em Lisboa, Fundação Arpad Szenes - Vieira da Silva expõe, em colaboração com CAM/Fundação Calouste Gulbenkian, Amigos de Paris: Lourdes Castro, René Bertholo, José Escada, Jorge Martins.  
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27JAN-04MAR2012 - No Centro Cultural de Cascais, Fundação D. Luís I expõe Artefactos Importantes e Objectos Pessoais da Coleção de Lenore Doolan e Harold Morris, Incluindo Livros, Roupa e Acessórios.

BREVIÁRiO

VGM edita em CD, sob chancela Alpha, Johann Sebastian Bach [1685-1750]: Concerts Avec Plusieurs Instruments (Vol. I a VI) - Intégrale por Café Zimmermann.
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Presença edita Reflexos Num Olho Dourado de Carson McCullers (1917-1967); tradução de Marta Mendonça. IMAG.317

Guimarães edita América, América de Jorge de Sena (1919-1978). 
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EXTRAORDINÁRiO

OS ALTERNATIVOS - Folhetim Aperiódico

QUANDO A NOITE ESTÁ PARADA VÃO-SE OS VENTOS DE MUDANÇA - 3

Ostensivamente, Olavo acariciou a rosa que levava na lapela. Depois, travou o passo, virando-se estreitamente para Silvina:
- Talvez seja assim... divagou, galanteador. Sim, a Primavera é também como uma mulher, que dá vida às coisas e regenera a nossa própria existência. Mas, considere, Silvina, no resto do tempo há, também, momentos inclementes ou escaldantes. Tal como os homens não são todos iguais!
Continua

segunda-feira, outubro 23, 2017

IMAGINÁRiO #391

José de Matos-Cruz | 16 Outubro 2012 | Edição Kafre | Ano IX – Semanal – Fundado em 2004

PRONTUÁRiO

CLARIVIDÊNCIA
Distinguido em 1997 com o Prémio Reuben para o Melhor Desenhador, e actualmente com 54 anos, Scott Adams - o inefável criador do irresistível Dilbert - é um artista bizarro, preciosista, cuja improvável consagração provem da perspectiva irónica e burocrática com que explora - agora a cores como se impunha, e pelas vivências pessoais / profissionais - as diversas temáticas em alusivo privilégio. Assim, e a propósito de Liberdade É Só Mais Uma Palavra Para as Pessoas Descobrirem Que És Incompetente, sob chancela Asa, desvenda como «a única maneira de escapar à escravidão da competência é cultivar cuidadosamente uma reputação de ser minuciosamente incompetente»…
Nas origens, Dilbert ganhou fama e proveito com tiras diárias em The New York Times, distribuindo-se depois por uns 1.950 outros jornais, como o nosso Diário de Notícias. Dilbert é um engenheiro informático, com cerca de 30 anos, cínico e inútil. Adams colheu inspiração como engenheiro de sistemas na Pacific Bell - permanecendo nesta companhia dos telefones durante anos. Com proveitos duvidosos, segundo Dilbert, «porque o meu projecto é uma desgraça ambulante e porque o meu chefe doou o cérebro a um museu de pastilhas elásticas».IMAG.261-346

MEMÓRiA

1884-16OUT1962 - Gaston Bachelard: Filósofo e poeta francês - «O real não é nunca aquilo em que se poderia acreditar, mas é sempre aquilo em que deveríamos ter pensado».

1740-18OUT1802 - Sophie Arnould: Cantora de ópera, soprano francesa - «A maior parte das mulheres galantes entrega-se a Deus, quando o Diabo já não as pretende».

21OUT1772-1834 - Samuel Taylor Coleridge: Filósofo e poeta inglês - «Os críticos são, frequentemente, pessoas que teriam sido poetas, historiadores, biógrafos… se tivessem podido; colocaram o seu talento à prova aqui e ali, e não conseguiram. Por isso, tornaram-se críticos».

1794-21OUT1872 - Jacques Babinet: Cientista francês, membro da Academia das Ciências - «A física, a química, a astronomia e a meteorologia devem-lhe grandes serviços». 28OUT1872 - Diário de Notícias

21OUT1982 - O Prémio Nobel da Literatura é atribuído a Gabriel García Márquez, pela «corajosa posição ao lado dos pobres, vítimas da opressão interna e da exploração estrangeira». IMAG.13-224-261-294

1811-23OUT1872 - Théophile Gautier: Ficcionista e poeta francês - «Poucas pessoas têm a coragem de ser covardes diante de testemunhas». IMAG.334

23OUT1942-2008 - Michael Crichton: Escritor e produtor de cinema e televisão, autor de Parque Jurássico - «Era o melhor a misturar aspectos da ciência com grandes conceitos dramáticos, e isto deu credibilidade a um imaginário em que os dinossauros vivem de novo sobre Terra. Tinha um temperamento gentil, e reservou a sua faceta mais extravagante para as narrativas literárias. Não há ninguém em tal actividade que possa preencher a sua ausência, ou continuar o seu trabalho romanesco» (Steven Spielberg). IMAG.26-223

VISTORiA

E se dormisses,
e se, dormindo, sonhasses,
e se, no teu sonho, viajasses até ao Céu,
e lá colhesses uma estranha e bela flor,
e se, ao acordar, encontrasses essa flor na tua mão?
Ah, que farias então?
Samuel Taylor Coleridge

Os próprios deuses morrem,
Mas os vermes soberanos
Residem
Mais fortes que os bronzes.

Esculpe, lima, grava;
O teu sonho flutuante
Sela-se
No bloco resistente!
Théophile Gautier
- A Arte (excerto)

VISTORiA

O espírito científico é essencialmente uma rectificação do saber, um alargamento dos quadros do conhecimento. Julga o seu passado, condenando-o. A sua estrutura é a consciência dos seus erros históricos. Cientificamente, pensa-se o verdadeiro como rectificação histórica de um longo erro, pensa-se a experiência como rectificação da ilusão comum e primeira.
Gaston Bachelard
- O Novo Espírito Científico (excerto)

Foi seu último livro. Tinha sido um leitor de voracidade imperturbável, tanto nas tréguas das batalhas como nos repousos do amor, mas sem ordem nem método. Lia a toda hora, com a luz que houvesse, ora passeando debaixo das árvores, ora a cavalo sob os sóis equatoriais, ora na penumbra dos coches trepidantes sobre os empedrados, ora balouçando na rede enquanto ditava uma carta. Um livreiro de Lima surpreendera-se com a abundância e a variedade das obras que seleccionou de um catálogo geral onde havia desde os filósofos gregos até um tratado de quiromancia. Na juventude, lera os românticos por influência de um professor Simon Rodríguez, e continuou a devorá-los como se estivesse a ler a si mesmo com seu temperamento idealista e exaltado. Foram leituras passionais que o marcaram para o resto da vida. Por fim, havia lido tudo o que lhe caíra nas mãos, e não teve um autor predilecto, mas muitos que o foram em diferentes épocas. As estantes das diversas casas onde viveu estavam sempre abarrotadas, e os dormitórios e corredores acabavam convertidos em desfiladeiros de livros amontoados e montanhas de documentos errantes que proliferavam à sua passagem, e o perseguiam sem misericórdia buscando a paz dos arquivos. Nunca chegou a ler tantos livros quantos possuía. Ao mudar de cidade, entregava-os aos cuidados dos amigos de maior confiança, embora nunca voltasse a ter notícia deles, e a vida de guerra obrigou-o a deixar um rasto de mais de quatrocentas léguas de livros e papéis, da Bolívia à Venezuela.
Gabriel García Márquez
- O General No Seu Labirinto (1989 - excerto)

CALENDÁRiO

1934-03JAN2012 - Victor Arriagada Ríos, aliás Vicar: Autor chileno de banda desenhada, ilustrador de Pato Donald / Donald Duck no mercado europeu - «Era um artista muito complexo, muito académico» (Herman Vidal/Hervi).

21ABR1912-04JAN2012 - Eve Arnold: Fotógrafa americana, fotojornalista e membro da Agência Magnum - «Eu já fui pobre e quis documentar a pobreza; perdi uma criança e andava obcecada com o nascimento; estava interessada em política e queria saber coma ela afecta as nossas vidas; eu sou uma mulher e queria saber mais sobre as mulheres».

1939-05JAN2012 - Pedro Osório: Compositor, maestro, orquestrador e pianista português - «…Era tão multifacetado quanto exigente e empenhado em cada projecto a que se dedicava… Imprimiu sempre uma marca de contemporaneidade e modernidade na música ligeira portuguesa» (Francisco José Viegas). IMAG.261

1929-08JAN2012 - Alexis Weissenberg: Compositor e pianista búlgaro, naturalizado francês - «Intelectualmente honesto, irónico e com uma certa distância em relação ao mundo. Não lhe interessava a fama, nem a intensa carreira de um pianista de concerto. Só tocava quando sentia que tinha algo a dizer ao mundo» (Norman Lebrecht).

20JAN-25FEV2012 - Em Guimarães, Laboratório das Artes expõe Marcha Lenta de Manuel Botelho. IMAG.364

NOTICIÁRiO

O Homem das Selvas
Diz a Gazeta de Goa que na vila de Acqvebapuz, província de Fysabá, em Bengala, apareceu um mancebo solitário, que vivia n’um covil de lobo e no estado inteiramente selvagem e primitivo. Só come carne crua, não fala língua alguma e foge para a solidão.
14SET1872 - Diário de Notícias

COROLÁRiO

Canção Colonial

Blanco dizi neglo furta
Neglo furta é ladrão;
Mas i blanco també furta
Té unha di gavião.
20OUT1872 - Diário de Notícias

ANTIQUÁRiO

OUT1872 - Neste mês, exportam-se de Lisboa 93 bois vivos, no valor de 6:280$000 réis.

BREVIÁRiO

Eucleia edita Não Humano de Osamu Dazai (1909-1948); tradução de Ana Neto.

COMENTÁRiO

Conta-me Como Foi…
Podemos certamente seguir o cinismo ou derrisão de Álvaro de Campos quando, depois de aceite a inevitabilidade das cartas de amor e do seu ridículo, conclui que, afinal, as memórias actuais que tem «Dessas cartas de amor/ É que são/ Ridículas». Mas não é apenas (ou principalmente) a exposição dessa fragilidade humana que move Manuel Botelho, na sua pesquisa e recriação. Ele é um dos autores que têm, no novo século, de modo profundo e inovador, trabalhado sobre o continente artisticamente quase inexplorado que é a Guerra colonial e a presença portuguesa em África.
João Pinharanda
(MAI 2011 - excerto)

domingo, outubro 22, 2017

IMAGINÁRiO #390

José de Matos-Cruz | 08 Outubro 2012 | Edição Kafre | Ano IX – Semanal – Fundado em 2004

PRONTUÁRiO

DETALHES
Logrando um sucesso intemporal e rendendo os leitores através de gerações, os grandes clássicos em quadradinhos geram fenómenos para além da nostalgia cultural e do fascínio artístico, os quais revertem para a própria sagração do imaginário. A partir dos títulos originais que celebraram as aventuras de Astérix o Gaulês, nada ficou igual quanto à revisão lúdica e irónica da história à escala europeia, cujo pólo de atracção é uma pequena aldeia de irredutíveis… Para conhecê-los melhor e aos seus aliados ou adversários, a Asa propõe a colecção Tudo Sobre…, concebida e realizada por Les Éditions Albert René, segundo a inspiração primordial de René Goscinny & Albert Uderzo. Além do venerável druida Panoramix, que controla o segredo da poção mágica, ou de Os Romanos, suas principais e preferidas vítimas, também Pepe - um miúdo caprichoso, natural da Ibéria - tem o seu livro de glória e memória. As imagens ao pormenor, e as revelações de circunstância, a par com os desenhos inéditos, tornam esta proposta irresistível e enriquecedora, sob o signo de Astérix - por Toutatis!

CALENDÁRiO

19DEZ2011 - O fado Já Não Estar (letra de Manuela de Freitas, música de José Mário Branco), interpretado por Camané no filme Mistérios de Lisboa de Raul Ruiz, integra a short-list de 39 candidatas para o Oscar à Melhor Canção Original, pela Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood. IMAG.287-330-357-371

19DEZ2011 - Reunida no Cinema São Jorge, a Assembleia Geral da Academia Portuguesa das Artes e das Ciências Cinematográficas decide atribuir anualmente, a partir de 2012, os Prémios Sophia (em homenagem à poetisa Sophia de Mello Breyner Andresen), os quais contemplarão os filmes de maior destaque nas diversas categorias - Longa Metragem, Curta Metragem, Documentário, Animação, Melhor Filme Estrangeiro - além de um Prémio Carreira. IMAG.2-18-112-168-213-249-268-302-362-364

1923-26DEZ2011 - Samuel Robert Rivers, aliás Sam Rivers: Saxofonista americano, integrou o movimento bebop (anos 50), tendo acompanhado a cantora Billie Holiday (anos 60) e o trompetista Miles Davis (1964) - «A sua abordagem à improvisação era desinibida e firmemente fundamentada em grande inteligência e excelência técnica» (The New York Times).

1920-30DEZ2011 - Ronald Searle: Ilustrador e cartoonista britânico, autor de St Trinian’s School (1948) - «Até ao fim, com um lápis e um pedaço de papel, continuou a desenhar tranquilamente, o que nos dá ideia da diferença de carácter entre ele e um ser humano comum» (Russell Branddon).

13JAN-23FEV2012 - Em Lisboa, Galeria Diferença expõe, no Espaço Quadrado, London Diaries de André Ruivo. IMAG.375-378

13JAN-11MAR2012 - No Centro Cultural de Cascais, Fundação D. Luís I expõe Instintos Oníricos de Cohen Fusé.

MEMÓRiA

09OUT1782-1866 - Lewis Cass: Militar e político americano - «As pessoas podem duvidar das tuas palavras, mas acreditarão nas tuas acções».

15OUT1922-2009 - Alfons Figueras: Argumentista e ilustrador espanhol de banda desenhada, criador de Aspirino y Colodión - «O público gosta de rir e, em geral, não tem consciência do terror que pende sobre a sua cabeça». IMAG.260

1920-15OUT2002 - Manuel Nunes da Fonseca, aliás Mário Castrim: Ficcionista, poeta e jornalista português - «Esperança: / é a maneira / como o futuro fala / ao nosso ouvido. / Depois / há que saber / organizá-lo. // Então / os comunistas entram em acção.» (Ser Comunista, Hoje). IMAG.175-317

INVENTÁRiO

COHEN FUSÉ

Se bem que a arte de Cohen Fusé se haja expandido no estrangeiro, chegando a países como Bélgica, Estados Unidos, Venezuela e Inglaterra, é na plataforma ibérica, designadamente em Portugal, que ele vem consumando as suas propostas estéticas de maior envergadura em disciplinas tão diversificadas como cerâmica, pintura mural, azulejo ou desenho de jóias. 
A dicotomia sedução / paixão cristalizada em Instintos Oníricos, a partir de referentes e referências que são parte intrínseca do imaginário do artista, constitui o núcleo aglutinador da sua pintura,  cuja expressão não raro se torna um desafio à perspicácia do fruidor. Entre naturezas mortas e a exploração mítica do corpo feminino, há-de aquele encontrar o equilíbrio que faz de umas e outra objectos de prazer. A síntese temática daí decorrente remete para um pacto de solidariedade entre o criador e o receptor da sua mensagem. 

COMENTÁRiO

Mistérios de Lisboa

Os enredos - múltiplos e diversificados - entrelaçam-se no conjunto dos 3 vols., sendo os seus protagonistas personagens estranhas que têm em comum a faculdade exótica de mudarem de nome com a mesma facilidade como quem muda de camisa. Assim, Pedro da Silva, conhecido por João, chamar-se-á também Álvaro de Oliveira; o «Come-Facas» usava os seguintes pseudónimos: Barba-Roixa, Leopoldo Saavedra, Tobias Navarro e Alberto Magalhães, e Sebastião de Melo faz-se passar pelo padre Dinis Ramalho e Sousa e duque de Cliton. Por outro lado, a vastidão do mundo (Portugal, França, Bélgica, Inglaterra, África, Japão e Brasil) é o cenário onde se desenrolam os conflitos ficcionais, marcados por vectores que perdurarão na novelística camiliana: a vingança, o anátema, o amor de mãe, a passionalidade, que se confunde com a ganância, a perversidade e a santidade. De permeio indícios vários de reminiscências biográficas do autor.
Alexandre Cabral
- Dicionário de Camilo Castelo Branco

Do mesmo modo que outros ilustres antecessores, como Os Mistérios de Paris de E. Sue, Sem Família, As Duas Pequenas Órfãs, as suas personagens são vítimas, são exemplo, de vertiginosa mobilidade social do século romântico que inventou a estética do suicídio e os direitos de autor, o culto pelos cemitérios e ruínas e a revolução libertária; o culto pela Idade Média e a indústria. Tal como acontece com eles, os Mistérios de Lisboa entram e saem do sistema narrativo que Camilo propõe, as histórias, tal como neles acontece, embrenham se nos seus próprios meandros, contam nos factos incríveis. E não acredita neles. A tempestade de avatares composta pelos três romances nunca é seguida de bom tempo…
Enquanto filmava os Mistérios…, pensei várias vezes em Lineu: um jardim é um campo de batalha. Toda a flor é monstruosa. Em câmara lenta, qualquer jardim é shakesperiano…
Raul Ruiz
- Prefácio a Mistérios de Lisboa (1853-1854) de Camilo Castelo Branco
- Edição Relógio D’Água (2010)

ANTIQUÁRiO

13SET1572 - Em Lisboa, prepara-se uma poderosa armada, que uns dizem ser para guerrear os turcos, outros para ir contra os huguenotes a favor de Henrique III. Compõe-se de quarenta navios de alto bordo e leva alistados dez mil combatentes. É comandada pelo general D. Duarte, filho do Infante D. Duarte. Mas levanta-se no rio tão forte temporal, que, em poucos momentos, umas naus vão ao fundo, outras ficam inteiramente inundadas. 13SET1865 - Diário de Notícias

OUT1872 - Neste mês, entram na Prisão do Limoeiro, em Lisboa, 128 detidos, saindo 155.

OUT1872 - Neste mês, despacham-se em Lisboa, para exportação, frutas frescas no valor de 20:532$700 réis, e ditas secas no de 18:947$060.

OUT1872 - Neste mês, exportam-se de Lisboa, para o estrangeiro, 1.390.000 quilogramas de minério de ferro, no valor de 8:800$000 réis.

OUT1872 - Neste mês, o café despachado em Lisboa, para consumo, consta de 221.798 quilogramas, dos quais 216.590 vieram das colónias, e paga de direitos 11:348$795 réis.

OUT1872 - Neste mês, exportam-se de Lisboa 26.196 decalitros de azeite de oliveira, no valor (para direitos) de 35:269$680 réis.

BREVIÁRiO

Dom Quixote edita A Toupeira de John Le Carré; tradução de J. Teixeira de Aguilar. IMAG.167-232-342

Universal edita em CD, sob chancela Deutsche Grammophon, René Pape - [Richard] Wagner [1813-1883], com Staatskapelle Berlin, sob a direcção de Daniel Barenboim. IMAG.14-68-78-86-104-111-147-212-215-285-330

Relógio D’Água edita De Olhos Abertos de Marguerite Yourcenar (1903-1987); tradução de Renata Correia Botelho. IMAG.47-159-263


Na série Astérix o Gaulês de René Goscinny & Albert Uderzo, Asa edita a colecção Tudo Sobre… Panoramix / Os Romanos / Pepe, com concepção e realização de Les Éditions Albert René. IMAG.2-4-21-29-37-58-69-76-94-101-136-179-206-245-248-275-290-342-356

Dom Quixote edita A Humilhação de Philip Roth; tradução de Francisco Agarez. IMAG.182-198-240-290-328-375

VISTORiA

Saudação À Primavera

Na hora certa.

Disse que chegaria.
Declarou dia e hora.
Tão longe que ela mora
que diabo, até
se lhe perdoaria
que, perdendo a maré,
chegasse no outro dia.

De tudo se abrigou
na sorte ingrata
e à hora exacta
«aqui estou!»
disse da alta esfera.

Bem-vinda Primavera!
Mário Castrim