segunda-feira, abril 02, 2018

IMAGINÁRiO #486

José de Matos-Cruz | 08 Outubro 2014 | Edição Kafre | Ano XI – Semanal – Fundado em 2004


PRONTUÁRiO

CINEFILIAS
Primeiro em grande, depois em longo - tais parâmetros definem, virtualmente, o solene ritual fílmico assumido e materializado por Cecil B. DeMille (1881-1959), personificando uma grandiloquente criatividade, única e específica na excessiva e insólita Hollywood. Aliás, tal desígnio e carisma, a plena ressurreição do imaginário, supera quaisquer desafios de análise crítica, estilhaça a perspectiva monográfica, persistindo como um desafio latente à nostalgia cinéfila e à revelação entre as mais jovens gerações. O que está em causa, sobretudo, é a obra sóbria ou sólida de uma personalidade essencial, a carreira controversa ou polémica de um artista determinante, para a indústria do audiovisual - não tanto pelo que actualmente se concebe ou expõe, mas em quanto referencialmente se impôs, ou explorou através de décadas… Mistério, magia, sortilégio, transfiguração, ressurreição - do que se projecta entre as luzes e as sombras, ao que se revê em múltiplos e distintos ecrãs - sempre com o mesmo fascínio, sempre por distintos olhares.

VISTORiA

I’ve Got You Under My Skin

I´ve got you under my skin
I´ve got you deep in the heart of me
So deep in my heart, that you´re really a part of me
I´ve got you under my skin

I´ve tried so not to give in
I´ve said to myself this affair never gonna swing so well
So why should I try to resist, when baby will I know damn well
That I´ve got you under my skin

I´d sacrifice anything come what might
For the sake of having you near
In spite of a warning voice that comes in the night
And repeats, repeats in my ear
Don´t you know little fool, you´ll never win
Why not use your mentality, come on step up to reality

But each time I do, just the thought of you
Makes me stop before I begin
´Cause I´ve got you under my skin
Cole Porter

O Rochedo

A nuvem de ouro dorme a noite inteira
no seio do gigântico rochedo.
Pela manhã, levanta-se bem cedo,
e descuidada vai-se pelos céus, ligeira.

Mas lá restou de orvalho um breve traço
nas rugas do penedo solitário.
E é como se ele ficara multivário
chorando suavemente ante o vazio espaço.

Mikhail Lermontov
(Tradução de Jorge de Sena)

o primeiro de todos os meus sonhos era sobre
um amante e o seu único amor,
caminhando devagar (pensamento no pensamento)
por alguma verde misteriosa terra

até o meu segundo sonho começar –
o céu é agreste de folhas; que dançam
e dançando arrebatam (e arrebatando rodopiam
sobre um rapaz e uma rapariga que se assustam)

mas essa mera fúria cedo se tornou
silêncio: em mais vasto sempre quem
dois pequeninos seres dormem (bonecas lado a lado)
imóveis sob a mágica

para sempre caindo neve.
e então este sonhador chorou: e então
ela rapidamente sonhou um sonho de primavera
– onde tu e eu estamos a florescer
E.E. Cummings
(Tradução de Cecília Rego Pinheiro)

MEMÓRiA

1707-08OUT1754 - Henry Fielding: Ficcionista inglês - «Um autor deve considerar-se não um cavalheiro que oferece um banquete particular ou de caridade, e sim alguém que dirige uma casa de pasto, pública, na qual são bem-vindas todas as pessoas em troca do seu dinheiro». IMAG.140

14OUT1894-1962: Edward Estlin Cummings, aliás E.E. Cummings: Poeta americano - «que afortunados são os amantes (cujos seres se submetem / ao que esteja para ser descoberto) / cujo ignorante cada respirar se atreve a esconder / mais do que a mais fabulosa sabedoria teme ver». IMAG.385

15OUT1814-1841 - Mikhail Iúrievitch Lérmontov, aliás Mikhail Lermontov: Poeta e ficcionista russo - «Olhei em volta, mas não vi ninguém. Escutei; pareceu-me que os sons vinham do Céu. Levantei os olhos: sobre o tecto da cabana estava uma rapariga com um vestido às riscas e o cabelo solto ao vento - como uma ninfa das águas. Com a mão fazia sombra aos olhos e fitava atentamente o largo; umas vezes, ria-se e falava consigo mesmo, depois voltava a cantar» (Taman - excerto). IMAG.332

15OUT1844-1900 - Friedrich Wilhelm Nietzsche: Escritor e filósofo alemão - «As mulheres podem tornar-se facilmente amigas de um homem; mas, para manter essa amizade, torna-se indispensável o concurso de uma pequena antipatia física». IMAG.37-69-228-288-338-441-444

1891-15OUT1964 - Cole Porter: Compositor e músico americano - «Os bons autores, que antes escolhiam os melhores termos, agora só usam palavras de quatro letras para escrever prosa… Tudo muda». IMAG.15-326

VISTORiA

Julgo razoável, leitor, antes de prosseguirmos juntos, explicar-lhe que pretendo fazer digressões no decurso de toda esta história sempre que tiver ensejo ou oportunidade, da qual sou melhor juiz do que qualquer lastimoso crítico que exista; e cumpre-me pedir aqui a todos esses críticos que tratem da sua vida, e não se metam em negócios ou obras que, de maneira nenhuma, lhes dizem respeito; pois, enquanto não demonstrarem a autoridade por cuja virtude se constituíram juízes, não me sujeitarei à sua jurisdição.
Henry Fielding
- A História de Tom Jones (1749, excerto)

Uma sociedade onde a corrupção se instala é acusada de abandono, de facto o prestígio da guerra e do entusiasmo marcial sofrem baixa visível; aspira-se aos prazeres da existência com tanto ardor, quanto aqueles antigamente postos em conquistar honrarias militares.
Mas os observadores talvez tenham negligenciado o facto de essa antiga energia, antiga paixão pela nação, que a guerra e torneios punham em tão pomposa evidência, transformou-se numa infinidade de paixões privadas e limitou-se a tornar-se menos visível… Que digo eu?
É até provável que no estado de corrupção sejam dispendidas uma força, uma violência energética muito maiores que nunca, pela nação, e que o indivíduo desperdice essa energia com muito maior prodigalidade do que podia fazer anteriormente, quando não tinha suficiente riqueza!
Precisamente nas épocas de abandono é que, portanto, a tragédia percorre as ruas e as coisas, que se vê nascer o grande amor, o grande ódio e a chama do acontecimento incendeia o céu.
Friedrich Nietzsche
CALENDÁRiO

26SET2013-09JAN2014 - Em Lisboa, BES Arte & Finança apresenta Helena Almeida - Andar, Abraçar; inclui fotografias da colecção BESart, sendo curador Delfim Sardo. IMAG.461-475

10OUT2013-06FEV2014 - Em Lisboa, Fundação Arpad Szènes-Vieira da Silva expõe Artistas Portugueses - Obras da Colecção Particular de Maria Helena Vieira da Silva e Arpad Szènes; inclui obras de Justino Alves, Manuel Amorim, Pedro Avelar, René Bartholo, Carlos Botelho, Manuel Cargaleiro, Lourdes Castro, Mário Cesariny de Vasconcelos, António Costa Pinheiro, José Escada, Jaime Isidoro, Eduardo Luís, Dália Martinho, Jorge Martins, Paula Rego, Henrique Silva, João Vieira e Úrsula Zangger.
 
COMENTÁRiO

Artistas Portugueses

A colecção de obras de arte de Maria Helena Vieira da Silva e de Arpad Szènes não resultou de um projecto pessoal, de uma vontade expressa e concretizada de criação de um núcleo de originais. Não se tratou também de um investimento ou aforro; a visão da arte como um bem comercial que traria futuros dividendos ainda não era generalizada. Vieira da Silva, não sendo uma coleccionadora metódica, revelava gosto em adquirir algumas peças de cerâmica, na maioria artesanato e arte popular, e azulejos antigos, que gostava de montar em renovadas composições.
A exposição dos artistas portugueses da colecção particular de Vieira da Silva e de Arpad Szènes desvenda, portanto, uma colecção não planeada, que funciona como uma espécie de diário, de álbum de clichês, registo de afectos e vivências, que situa, através da produção artística, a presença de determinada pessoa em determinado momento. São na maioria ofertas, algumas aquisições – em parte para ajudar os «jovens artistas» – que revelam parte da história do casal e dos que com ele se relacionaram. 
 
BREVIÁRiO

Eureka edita em DVD e em Blu-ray, Cleópatra / Cleopatra (1934) de Cecil B. DeMille; com Claudette Colbert e Warren William. IMAG.96-248

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