quinta-feira, novembro 23, 2017

IMAGINÁRiO #405

José de Matos-Cruz | 01 Fevereiro 2013 | Edição Kafre | Ano X – Semanal – Fundado em 2004

PRONTUÁRiO

VIRTUALIDADES
Cada vez mais influente e alternativa, a partir dos anos ’90 do Século XX, a multifacetada indústria de conteúdos lúdicos acabaria por superar o primado tecnológico - sobre a especificidade do espectáculo ou as virtualidades mediáticas, que se delimitam pelos jogos de computador. Um fenómeno compósito, no qual converge a propensão artística de sectores determinantes dos criadores, com o estímulo sublimado por significativas camadas de público mentor. Em suas amplas conexões, tal articulação dinâmica, interactiva, representa uma síntese embrionária mas versátil, de transferência da tradição ritual e épica para os imaginários futuristas.
Manifestação aliciante de tais virtualidades, A Arte de Under Siege reúne em álbum, sob chancela Asa, amplos materiais alusivos ao primeiro videojogo português, pelos Seed Studios, para PlayStation 3 - incluindo esboços, imagens 3D ou esquemas, além de Under Siege: Primeiro Encontro - uma banda desenhada já distribuída digitalmente, e que serve de introdução ao universo referencial - com argumento de Filipe Pina e ilustração de Filipe Andrade, com base na concepção original por Bruno Ribeiro e André Mealha. Eis um manancial múltiplo e fascinante - dando vida, como sublinha o produtor Jeffrey Ferreira em Introdução, «a cada uma das ideias que surgiram, fossem elas paisagens magníficas ou criaturas fantásticas, que de um momento para o outro passaram a habitar no subconsciente de cada um».

MEMÓRiA

01FEV1933-2011 - Reynolds Price: Poeta, novelista, dramaturgo e ensaísta norte-americano - «Desde o início, teve uma voz própria, um tom lírico, um sentido de humor e uma visão profunda de como as pessoas viviam» (Allan Gurganus - The New York Times). IMAG.341

1899-01FEV1973 - Edmundo de Bettencourt: Poeta e cantor português - «Foi tão grande cantor como poeta. O mais intelectual trovador que passou por Coimbra. Na base desse intelectualismo - superioridade na visão, justeza no senso crítico - enraizou em todo o seu acerto nos motivos preferidos, desprendendo-se de toadas doentias, repudiando as dolências depressivas, não transigindo com arrastamento de frases, seleccionando, enfim, tanto a letra como a música, a que a sua privilegiada garganta daria nova forma e expressão» (Afonso de Sousa - O Cantor e a Guitarra Na Década de Oiro da Academia de Coimbra - 1920-1930). IMAG.175-237

16MAR1923-01FEV1993 - Augusto Cabrita: Fotógrafo português, director de fotografia, produtor e realizador de cinema e televisão - «O prólogo da minha volta de todos os dias é exercitar os primeiros golpes de vista… O Sol é o melhor projector que há: nada supera a luz natural». IMAG.45-332-398

02FEV1883-1958 - Johnston McCulley: Escritor canadense, autor de Zorro, aparecido na revista All Story em 1919 - «Apesar das aparências, Zorro não é simplesmente um homem de acção, mas também um herói que recorre à força para afirmar a cultura e a sabedoria» (Fabio Troncarelli). IMAG.71-87-204-209

1939-03FEV2003 - João César Monteiro: Escritor e cineasta português - «…Resta-me reconhecer a solidão moral de uma prática cinematográfica cavada na dupla recusa de ser uma espécie de carro de aluguer da classe mais favorecida e, o que é mais grave, de trocar essa profunda exigência por toda e qualquer forma de demagogia neo-fadista que transporte e venda a miserável ilusão de servir outra coisa» (A Minha Certidão - excerto - Revista &ETC - 1973). IMAG.10-48-129-158-213-292-317

1909-05FEV1993 - Joseph L. Mankiewicz: Escritor e cineasta americano - «Na minha carreira de realizador, fui testemunha do início, da ascensão, do auge, do declínio e do crepúsculo do cinema sonoro». IMAG.83-231

1707-06FEV1793 - Carlo Goldoni: Dramaturgo italiano - «O mundo é um belo livro, mas será pouco útil a quem não o saiba ler». IMAG.134

07FEV1803-1869 - Hector Berlioz: Compositor francês - «Tenho a certeza de que conseguirei destacar-me com a música. Quero ser alguém, deixar na Terra traços de minha existência… O tempo é um grande mestre - tem, porém, o defeito de matar os seus discípulos». IMAG.54-78-84-254-308

1814-07FEV1873 - Sheridan Le Fanu: Escritor irlandês - «Todas as coisas vieram da Natureza, não vieram? Todas as coisas no céu, na terra e debaixo da terra agem e vivem como ordena a Natureza?» (Carmilla - excerto).


VISTORiA

Claro que estes maridos
são uns grandes desgraçados.
O pão de casa nunca lhes basta.
Carlo Goldoni
Canção

Não te deites, coração,
À sombra dos teus amores.
Não durmas, olha por eles,
Com alegrias e dores.

Não tenhas medo. O calor
Que vem das serras ao mar,
Erguendo incêndios, não queima
O que não é de queimar.

Agradece ao vento frio
Que traz chuva miudinha:
É neve que se aproxima,
Tormenta que se avizinha...

Nos incêndios naturais
Queima ramos de saudades
E faz a tua canção
Do grito das tempestades!
Edmundo de Bettencourt

CALENDÁRiO

16AGO1923-27MAR2012 - Millôr Fernandes: Escritor, humorista, ilustrador e jornalista brasileiro, autor de Pif-Paf (1941 - O Cruzeiro) e co-fundador de O Pasquim (1969) - «Com muita sabedoria, estudando muito, pensando muito, procurando compreender tudo e todos, um homem consegue, depois de mais ou menos quarenta anos de vida, aprender a ficar calado». IMAG.34

14ABR-20MAI2012 - No Centro Cultural de Cascais, Fundação D. Luís I apresenta, com Associação Ser +, Private Lives 2012 - exposição de fotografia de Cláudia Rita Oliveira, Cristina Ataíde, Duarte Amaral Netto, Eduardo Nery, Fernando Fadigas, Helena Peralta, Inês Velez, João Paulo Serafim, Leonor Guerra, Luís de Barros, Luis Noronha da Costa, Maria Leonardo, Mariana Marote, Mário Palma, Orlando Franco, Pedro Cabrita Reis, Ricardo Quaresma Vieira, Rodrigo Amado, Rodrigo Bettencourt da Câmara, Susana Anágua, Teo Pitella e Teresa Palma, sendo curadora Margarida Prieto.

15ABR2012 - No Centro de Artes e Espectáculos de Guimarães, MGN Filmes, ZON Audiovisuais e Guimarães 2012 - Capital Europeia da Cultura apresentam Capitães da Areia de Cecília Amado; sobre a obra de Jorge Amado (1912-2001), com Jean Luís Amorim e Ana Graciela. IMAG.333-382

BREVIÁRiO

Casa das Letras edita Voo Nocturno / Correio do Sul de Antoine de Saint-Exupéry (1900-1944); tradução de Mário Dias Correia. IMAG.88-243-280-351

Associação Chili Com Carne e The Inspector Cheese Adventures editam Mistery Park de André Ruivo - álbum em banda desenhada, inclui pianistas bêbados, patinadores, cães e donos, pássaros, carros, leitores de jornais, polícias-crianças, chá, guitarristas, peixes, rádio a pilhas, fumadores, táxis, mergulhadores, fotógrafos, walkman, índios, robots, gémeos, gatos, namorados, casais, bichos de estimação, semáforos, sem-abrigo, detectives. IMAG.375-378-390


COROLÁRiO

Música, Divina Música!

Tanto duvidaram dele, da teoria daquele jovem gênio musical, que ele resolveu provar pra si mesmo, empiricamente, a teoria de que não existem animais selvagens. Que os animais são tão ou mais sensíveis do que os seres humanos. E que são sensíveis sobretudo ao envolvimento da música, quando esta é competentemente interpretada.
Por isso, uma noite, esgueirou-se sozinho pra dentro do Jardim Zoológico da cidade e, silenciosamente, se aproximou da jaula dos orangotangos. Começou a tocar baixinho, bem suave, a sua magnífica flauta doce, ao mesmo tempo em que abria a porta da jaula. Os macacões quase que não pestanejaram. Se moveram devagarinho, fascinados, apenas pra se aproximar mais do músico e do som.
O músico continuou as volutas de sua fantasia musical enquanto abria a jaula dos leões. Os leões, também hipnotizados, foram saindo, pé ante pé, com o respeito que só têm os grandes aficionados da música. E assim a flauta continuou soando no meio da noite, mágica e sedutora, enquanto o gênio ia abrindo jaula após jaula e os animais o acompanhavam, definitivamente seduzidos, como ele previra.
Uma lua enorme, de prata e ouro, iluminava os jacarés, elefantes, cobras, onças, tudo quanto é animal de Deus ali reunido, envolvidos na sinfonia improvisada no meio das árvores. Até que o músico, sempre tocando, abriu a última jaula do último animal - um tigre.
Que, mal viu a porta aberta, saltou sobre ele, engolindo músico e música - e flauta doce de quebra. Os bichos todos deram um oh! de consternação. A onça, chocada, exprimiu o espanto e a revolta de todos:
Mas, tigre, era um músico estupendo, uma música sublime! Por que você fez isso?
E o tigre, colocando as patas em concha nas orelhas, perguntou:
Ahn? O quê, o quê? Fala mais alto, pô!
Moral: Os animais também têm deficiências humanas.
Millôr Fernandes

PARLATÓRiO

Quando acabo de fazer um filme, afinal o que emerge do fundo dos cristais é a minha própria vida. Puta de vida cheia de merda e de loucura, mas vida tendo por única ambição a estatura do homem, a deste seu amigo que não abdica de mudá-la e irá teimosamente continuar a chatear estes filhos da puta até ao fim dos seus dias, a encher-lhes os gordos cus, Deus me perdoe, de subtis venenos.
João César Monteiro
 

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