sexta-feira, novembro 17, 2017

IMAGINÁRiO #402

José de Matos-Cruz | 08 Janeiro 2013 | Edição Kafre | Ano X – Semanal – Fundado em 2004


PRONTUÁRiO

SUBSISTÊNCIA
O quotidiano de uma pequena aldeia isolada das montanhas, no Japão de finais do Século XIX, eis o envolvimento de A Balada de Narayama / Narayama-bushi Kô (1983) de Shohei Imamura. Um circunstancialismo cruel, de miséria e carências, a que se ligam os rituais comunitários sob implacável disciplina, quando em jogo está a sobrevivência. Em particular, o trágico destino de uma família de ladrões, e a exemplar tenacidade de uma velha mulher, em resolver os problemas dos dois filhos, antes de ser levada para o Narayama, a fim de morrer e reintegrar o espírito divino da natureza…
Distinguido com a Palma de Ouro do Festival de Cannes - com que Imamura voltaria a ser galardoado em 1997, por A Enguia / Unagi - este clássico do cinema nipónico parte de um consagrado texto literário de Shichiro Fukazawa, Narayma (a par de Homens do Norte), sobre o qual Keisuke Kinoshita havia já realizado, em 1958, um filme com o mesmo título. Símbolos intemporais, valores em causa, transfiguram uma existência singular e colectiva, em que o mero acto sexual assume um vertiginoso motivo de prazer e salvaguarda da espécie.

MEMÓRiA

08JAN1823-07NOV1913 - Alfred Russel Wallace: Naturalista, antropólogo, biólogo e espírita britânico - «Eu era um materialista tão convencido, que não admitia absolutamente a existência do mundo espiritual. Os factos, porém, são coisas pertinazes. Eles obrigam-me a aceitá-los como factos. Os fenómenos espíritas estão tão bem comprovados, como os factos de todas outras ciências».

08JAN1923-2011 - Giorgio Tozzi: Cantor lírico norte-americano - «Sabia tudo sobre arte e política, mas era um homem simples, sem o ego das vedetas» (Roger Havranek). IMAG.362

1922-08JAN2003 - José Viana: Actor português - «Apesar de ser um dos grandes actores da sua geração, o cinema poucas oportunidades lhe ofereceu» (Jorge Leitão Ramos). IMAG.397

09JAN1753-01OUT1833 - Luísa Rosa de Aguiar Todi, aliás Luísa Todi: «Cantora portuguesa que encheu a Europa com os ecos da sua voz e a fama do seu nome, considerada um modelo de perfeição artística pela crítica de 1778, coberta de louros e cercada pelas saudações ruidosas da sua imensa glória» (Diário de Notícias - 25MAR1872).

11JAN1913-1990 - Rubem Braga: Escritor brasileiro - «Há um grande vento frio cavalgando as ondas, mas o céu está limpo e o sol é muito claro. Duas aves dançam sobre as espumas assanhadas. As cigarras não cantam mais. Talvez tenha acabado o verão».

12JAN1783-1847 - Erik Geijer: Escritor e compositor sueco - «O que se faz de grande, faz-se em silêncio» (O Camponês).


13JAN1873-1932 - Joshua Benoliel: Fotógrafo e jornalista português - «Sente-se o amor que este homem tinha pela sua cidade e pelas suas gentes, a facilidade com que deambulava pelas ruas mais esconsas, testemunhando a precariedade das situações sociais, numa atitude próxima dos americanos Riis e Hine. É uma postura mais íntima, mais ‘fado’, mais humana» (José Pedro de Aboim Borges). IMAG.42-357

13JAN1913-1979 - Gilbert Cesbron: Escritor francês - «Todos os homens têm dois inimigos: o passado e o futuro. O presente é o maior presente que Deus lhes deu».

VISTORiA

As Laranjas

laranjas são brasas vivas sobre ramos
ou rostos espreitando entre colinas verdes?
e a ramaria, folhas que baloiçam
ou formas frágeis que me causam pena?

vejo-te, laranjeira, com os teus frutos,
lágrimas rubras dos tormentos do amor.
são sólidos mas, se fundidos, vinho seriam
moldados pelas mãos mágicas da natureza.
são bolas de cornalina sobre ramos de topázio
à espera do açoite da brisa.
porque tais frutos beijamos,
ou seu cheiro aspiramos,
eis que às vezes nos parecem
ou rostos de raparigas
ou pomos feitos perfume.
Ibn Sâra, as-Santarini

DEDICATÓRiA

Aos meus amigos de Sagny, ofereço esta história que não tinha o direito de escrever, porque nunca fui pobre, nem padre, nem operário.
Gilbert Cesbron
- Os Santos Vão Para o Inferno (1952)


VISTORiA

Despedida

E no meio dessa confusão alguém partiu sem se despedir; foi triste. Se houvesse uma despedida talvez fosse mais triste, talvez tenha sido melhor assim, uma separação como às vezes acontece em um baile de carnaval - uma pessoa se perde da outra, procura-a por um instante e depois adere a qualquer cordão. É melhor para os amantes pensar que a última vez que se encontraram se amaram muito - depois apenas aconteceu que não se encontraram mais. Eles não se despediram, a vida é que os despediu, cada um para seu lado - sem glória nem humilhação.
Creio que será permitido guardar uma leve tristeza, e também uma lembrança boa; que não será proibido confessar que às vezes se tem saudades; nem será odioso dizer que a separação ao mesmo tempo nos traz um inexplicável sentimento de alívio, e de sossego; e um indefinível remorso; e um recôndito despeito.
E que houve momentos perfeitos que passaram, mas não se perderam, porque ficaram em nossa vida; que a lembrança deles nos faz sentir maior a nossa solidão; mas que essa solidão ficou menos infeliz: que importa que uma estrela já esteja morta se ela ainda brilha no fundo de nossa noite e de nosso confuso sonho?
Talvez não mereçamos imaginar que haverá outros verões; se eles vierem, nós os receberemos obedientes como as cigarras e as paineiras - com flores e cantos. O inverno - te lembras - nos maltratou; não havia flores, não havia mar, e fomos sacudidos de um lado para outro como dois bonecos na mão de um titeriteiro inábil.
Ah, talvez valesse a pena dizer que houve um telefonema que não pôde haver; entretanto, é possível que não adiantasse nada. Para que explicações? Esqueçamos as pequenas coisas mortificantes; o silêncio torna tudo menos penoso; lembremos apenas as coisas douradas e digamos apenas a pequena palavra: adeus.
A pequena palavra que se alonga como um canto de cigarra perdido numa tarde de domingo.
Rubem Braga
- A Traição das Elegantes (excerto, 1967)

COMENTÁRiO

Joshua Benoliel

O seu feitio pessoal, caracterizado por uma exuberância sadia, voz forte, desempeno de opiniões, sinceridade por vezes demasiada, nos centros de cavaco e em todos os lugares onde se podia entrever uma notícia, fez dele uma personalidade originalíssima.
Diário de Lisboa

ANUÁRiO

1043-1123 - Ibn Sâra, as-Santarini: Poeta íbero-árabe - «[É] sobre a face branca de uma página / que, ao mesmo tempo, por meio da tinta negra / das linhas, [se] anuncia / noite e dia...» (Panegírico de Abú Umayya ibn ‘Isâm).

1863 - Neste ano, há no distrito de Coimbra 7.165 nascimentos, sendo 3.636 do sexo masculino e 3.529 do feminino; o número de casamentos é de 1.692.

COROLÁRiO

Entre os clássicos de sucesso e os desafios irresistíveis, do passado e do futuro, a actualidade editorial de Lucky Luke, o cowboy que dispara mais rápido do que a própria sombra, prossegue - sob chancela Asa - Na Pista dos Dalton (1971), a partir da sensacional inspiração original por René Goscinny (1926-1977) e Morris/Maurice de Bevère (1923-2001), que também ilustra o espectacular Fingers (1983), sobre argumento de Lo Hartog Van Banda (1916-2006).


Entretanto, e imaginemos que, muito tempo antes, o Far West é o seu recreio, para revelar um precoce e ousado Kid Lucky como O Aprendiz de Cowboy (2011), tal como concebeu e ilustrou Achdé/Hervé Darmenton, mantendo coerente e rejuvenescido - entre a nostalgia e a cumplicidade - um grafismo estilizado e uma genica característica, para gáudio de todos os leitores, impenitentes ou virtuais.
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CALENDÁRiO

22MAR2012 - Midas Filmes estreia Swans de Hugo Vieira da Silva e Heidi Wilm; com Kai Hillebrandt e Ralph Herforth. IMAG.125

BREVIÁRiO

Divisa edita em DVD, A Balada de Narayama / Narayama-bushi Kô (1983) de Shohei Imamura; com Ken Ogata e Tonpei Idari. IMAG.97-134-383

Ática edita Argumentos Para Filmes de Fernando Pessoa (1888-1935.
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Naxos edita em CD, Jean Sibelius [1865-1957] - Symphonies Nºs 6 and 7/Finlandia por New Zeland Symphony Orchestra, sob a direcção de Pietari Inkinen. IMAG.213

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