domingo, outubro 01, 2017

IMAGINÁRiO #380

José de Matos-Cruz | 24 Julho 2012 | Edição Kafre | Ano IX – Semanal – Fundado em 2004

PRONTUÁRiO
 
AVENTURAS
As feições clássica e moderna dos quadradinhos nipónicos, ou mangà, têm divulgação continuada, entre nós, sob chancela Asa, estilizando contiguidades heróicas e artísticas, sob o elã da aventura fantástica, com privilégio dos leitores adolescentes através de gerações. Surgido em 1986, pelo engenho de Akira Toriyama, fundador do Bird Studio, Dragon Ball adapta a luta do bem contra o mal ao imaginário infantil, conferindo ao ser humano uma configuração virtual - com pequenos guerreiros adolescentes, e o prodígio das artes marciais.
Para Yu-Gi-Oh!, tudo começou em 1996, com Kazuki Takahashi, através da revista Shonen Jump, sagrando as aventuras de um adolescente que se serve dum jogo de cartas, para enfrentar desafios e adversários, de um modo intenso e radical… Prolongando os rituais e as emoções originais, com repercussão no universo dos produtos lúdicos, a leitura de Dragon Ball e de Yu-Gi-Oh! faz-se da direita para a esquerda (das últimas para as primeiras páginas), até convocar outros enigmas e fantasias virtuais. IMAG.68-348-349




CALENDÁRiO

1925-04OUT2011 - Mário Alberto: Artista plástico, cenógrafo e figurinista português, co-fundador do Teatro Adoque (1974) e do grupo A Barraca (1976) - «Vi-o pintar, caricaturar celebridades mundiais, criar cenários e figurinos, colaborei nas suas exposições e sempre insisti que não descurasse a pintura pois, durante anos, o Ar-Cénico do Teatro assoberbou-o quase por completo, com o ritmo palpitante das montagens, autorias de textos, criação de grupos teatrais, professorado, júris, homenagens, prémios, festivais e muitos etc's, também cinematográficos e televisivos, apenas lhe permitiram tempo para um número limitado de exposições de pintura» (António de Macedo).

1926-08OUT2011 - Luís Archer: Cientista português, pioneiro da investigação em genética molecular, padre jesuíta - «Uma paz de espírito… só se consegue quando superamos o ódio, a inveja e todos esses sentimentos que nos impedem de amar os outros como a nós mesmos. A velhice, o sofrimento, não complicam essa paz, porque o meu Deus não envelhece nem morre» (2006).

13OUT-11DEZ2011 - No Museu da Electricidade, Fundação EDP e The Moth House apresentam The Time Machine, exposição de fotografias de Edgar Martins.

MEMÓRiA

1404-20ABR1472 - Leon Battista Alberti: Humanista, teórico de arte e arquitecto italiano, autor de De Re Aedificatoria Libri Decem (1452) - «Uma obra está completa quando nada pode ser acrescentado, retirado ou alterado, a não ser para pior».

1903-22JUL1972 - Max Aub: Escritor espanhol, exilado no México - «Há três categorias de homens: a) os que contam a sua história; b) os que não a contam; c) os que não a têm» (Contos Certos).

1893-24JUL1982 - Florence Henri: Pintora e fotógrafa suíça, influenciada pelo cubismo e pelo construtivismo.

26JUL1922-2010 - Blake Edwards: Actor, argumentista e realizador do cinema americano, distinguido com um Óscar Honorário pela Academia de Hollywood (2004) - «Para muitos críticos, foi difícil aceitar que ele era mais do que um cineasta popular. Os seus detractores reconhecem o seu estilo formal, mas deploram-lhe a ausência de profundidade. Sob a aparência da comédia e do divertimento, todos os seus filmes reflectem, com rigor, os valores da vida contemporânea» (George Morris). IMAG.14-225-335

28JUL1862-1931 - Aurélio da Paz dos Reis: Floricultor, republicano e pioneiro do cinema português - em finais de 1896, registou uma parte significativa de testemunhos documentais e característicos pelo cenário urbano de Porto e Lisboa. IMAG.4-87-106-308-339

28JUL1902-1994 - Karl Popper: Escritor e filósofo britânico, de origem austríaca - «Não é possível discutir racionalmente com alguém que prefere matar-nos, a ser confrontado ou convencido pelos nossos argumentos». IMAG.192

INVENTÁRiO

A España, donde crecí
estas hojas aún verdes
de un árbol desarraigado.
Amor, el viento te lleve.
Max Aub

VISTORiA

Começou a mexer o café com leite com a colherzinha. O líquido quase transbordava da chávena empurrado pelo movimento do utensílio de alumínio (o recipiente era vulgar, o sítio era ordinário e a colher estava arredondada pelo uso). Ouvia-se o barulho do metal contra o vidro. Tim, tim, tim, tim. E o café com leite girava, girava com uma cova no meio. Um maelstrom. E eu encontrava-me sentado mesmo à frente. O café estava à pinha. O homem continuava a mexer, a mexer, imóvel, e sorria ao olhar-me. Senti uma coisa subir por mim acima. Fitei-o de tal maneira que se viu na obrigação de se explicar:
- O açúcar ainda não está derretido.
Para mo provar, bateu com a colher várias vezes no fundo do copo. Recomeçou a mexer metodicamente a beberagem, com uma energia redobrada. Voltas e mais voltas, sem parar, eternamente. Voltas e mais voltas e mais voltas. E continuava a olhar para mim, sorrindo. Então puxei da pistola e disparei.
Max Aub
- Crimes Exemplares (1957, excerto)
COMENTÁRiO

TUDO EM CAUSA

Um dos géneros com maiores tradições no espectáculo sob o signo de Hollywood, aliando a popularidade comercial ao culto das vedetas, a comédia romântica estiliza os caprichos duma realidade sempre em mutação, pela qual se conjugam as relações públicas e privadas. A vivacidade sensual de Kim Basinger, entre equívocos e humores, ressalta em Encontro Inesquecível / Blind Date (1987), celebrando o veterano Blake Edwards de regresso à abordagem de estratos sociais, cuja frivolidade e sofisticação se exteriorizam através de irresistíveis, devastadoras peripécias em que a sátira corrosiva confina, privilegiadamente, um precário reflexo entre os compromissos mercantis e os códigos de comportamento. Em causa, está um argumento de David Lerner, novel escritor que privilegia a pose, o imprevisto e o artifício - motivações propícias à ambiguidade carismática de Bruce Willis, pela primeira vez em grande ecrã, mas então um símbolo masculino já consagrado pela televisão em Modelo e Detective (1985). Assim, expõem-se os azares de Walter Davis, um executivo maníaco do trabalho. Ao longo dum jantar de negócios, decisivo para a sua carreira em ascensão como analista financeiro, Walter esquece que Nadia Gates, a esbelta jovem que mal conhecia e por quem se fez acompanhar, tem reacções imprevisíveis quando começa a beber. Pior ainda, o ex-namorado de Nadia, David Bedford, um ciumento compulsivo, detesta vê-los juntos e converte Walter em seu alvo preferencial... Tendo já dirigido Basinger em Meus Problemas Com as Mulheres (1983), Blake Edwards catalisa na sua extravagante personagem a hilariedade eventual das peripécias - virtualizadas pela música do favorito Henry Mancini, logrando uma sugestiva alusão ao envolvimento e aos correspondentes pretextos histriónicos. Num balanço artístico sobre esta quadragésima quinta longa metragem com a sua assinatura, Edwards comentaria que «Willis é uma vítima divertida da ambição, enquanto Basinger faz das fraquezas um toque de classe».

PARLATÓRiO


Quando investigo e descubro que as forças dos céus e dos planetas estão do nosso lado, então, compreendo que estou a viver entre deuses.
Leon Battista Alberti




BREVIÁRiO

Ulisseia edita As Boas Intenções de Max Aub (1903-1972); tradução de Alberto Gomes. IMAG.239

Fundação Calouste Gulbenkian edita Da Arte Edificatória de Leon Battista Alberti (1404-1472); tradução de Arnaldo M. Espírito Santo. IMAG.214
Sony edita em CD, sob chancela RCA, Frédéric Chopin [1810-1849]: Ballades pelo pianista Jean-Marc Luisada. IMAG.92-191-203-247-265-298-325-375

COMENTÁRiO

O Fulgor da Irreverência

Nunca vi o Mário Alberto de gravata. Ele é o contrário do convencional, do académico, do normalizado.
Na pintura, também. Ou, antes, na pintura, sobretudo. Ele emerge do fulgor enorme da irreverência, da provocação, da inconformidade. É a sua forma de estar vivo. De ser ele.
E é, de resto, a sua forma de pintar. Surpreendente. Excessiva, às vezes. Incómoda, sempre.
Intransigentemente imaginativa.
Mágica, mas exacta. Direi mesmo, mágica porque exacta.
Rigorosa, na sua feroz e obsessiva vigilância das cores e das tonalidades que condicionam a realidade das realidades (objectos - e sujeitos reais) que ele pinta - muitas vezes representadas numa espécie de teatralidade monstruosa que se estiliza até à erudição (pictórica) sem nunca perder a raiz popular autêntica e telúrica, e que lhes confere uma inconfundível identidade e especificidade. Ele consegue esta alquimia.
Para Mário Alberto, irreverente e brilhante, pintar e existir é transgredir. Transgredir em deslumbramento. Transgredir, como quem, sendo temente a Deus, comesse em sexta-feira santa um chouriço de Lamego bem assado.
É pecado, sim senhor! Mas Deus perdoa.
Vamos, mas é... regar isto com um bom tintol!
O padre Osório é que tem razão.
Gonsalves Preto

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